segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Pensava justamente nisso enquanto observava suas mãos velhas e enrugadas apertando com força a porcelana tudo menos branca da pia nojenta de um posto de beira de estrada. Não queria olhar também no espelho. Odiava o que sabia que veria, como odiava todas as coisas, mesmo não sabendo o que são ou quem são, como era o caso. Um suspiro pesado precedera um ato de coragem quando levantou o rosto e se encarou. Conservava a negrura dos cabelos e da barba, sem cortar ou fazer há muito tempo. Olhos ainda mais escuros e abissais desafiavam e demonstrava todo sua decepção.Perdera inteiros dezasseis anos de sua vida, quinze dos quais afundando cada vez mais e se importando cada vez menos. O olhar abissal cedeu e deixou uma lágrima correr incerta por caminhos a tanto secos. Não se lembrava de ter chorado também. Isso o fez sentir menos humano ainda. Não tinha uma vida de verdade, não tinha uma identidade, não conhecia ninguém senão a si mesmo e esse era o que menos sabia algo sobre e que mais o perturbava. Saindo de um buteco sujo do centro da cidade, mais bêbado que a maioria, menos do que estava acostumado, seguia sem rumo e pensamentos, por ruas cada vez mais escuras, menos policiadas, mais distantes do centro e próximo da pobreza. Depois de caminhar por alguns minutos resolvera separar o dinheiro q ia precisar, como os caras pediam, pra agilizar o negocio. A boca ficava alguns metros depois de um bar, virando uma esquina. Um garoto com cara de roqueiro o seguia há algum tempo, com certeza indo buscar maconha, pensou o velho. Virou a esquina e parou no bar, como de costume, pra uma dose de conhaque e de decisão. O dia rendera bem, limpou duas calçadas e tinha dinheiro o bastante pra três pedras de crack, dois tubos de farinha e uma paranga de maconha, ou tudo em crack. Usar todo seu dinheiro em crack nunca foi uma opção que escolhera. Tinha medo de morrer sem saber quem era. Mas desde então tem se tornado mais resistente a droga, por mais que sempre desse um “tempo” entre ciclos de vicio. Gastar todo seu dinheiro seria como comprar seu primeiro maço de cigarros. E deveria pensar em onde passaria a noite e comeria amanhã, e reservar dinheiro pra isso. Ser um desabrigado é muito caro. Então um pensamento veio a sua cabeça, como viera muitas vezes nas ultimas semanas. Por que não comprar todo o dinheiro em crack? Porque ele poderia morrer facilmente assim, foi a resposta de si pra si. Apenas mais um motivo, suspirou um coração pesado e dolorido. Segurou o nó na garganta e o ardor dos olhos, respirou fundo por uns instantes e secou seu copo de conhaque num gole só. Passos largos e firmes o conduziram naquele dia. O jogo foi rapido, setenta reais, tudo em crack mano! Dá um tempinho ali chefia, que vô pegá pro sinhor. Alguns segundos, se muito se passaram e lhe entregaram uma trouxinha. A maior que ja tivera na verdade. No momento em que sentiu o volume e o peso, sabia que iria morrer naquela noite. Sorriu como não se lembrava que sorrira.

sábado, 16 de janeiro de 2010

A força da explosão batia em odio num peito velho e cansado da vida. odio que preenchia cada mero cubico do quartinho alugado no fundo do quintal de uma familia prolematica, como todas.
as paredes com tinta mais descascada que amarelada mal continha as pulsações de odio do velho corção que se alimentara dele ja por tantos anos.
de bar em bar, ponto de drogas e assistencias sociais ele percorreu os ultimos quinze anos. ja esquecera seu nome, profissão, familia, amigos, historia e até o por que de tanto odio que o consumia, e isso o enfurecia ainda mais. Tentava afogar a furia em vinho, rum, cocaina, crack, cerveja, vodka, perfume, heroina, maconha, prostitutas, brigas, vadiagem, anarquismo e mendigagem, mas não sabia por que.
mas ainda assim sabia que não era exatamente esse homem que via tudo em tos de vermelho-ira. Que vivia em constante medo e agonia, que jamais cultivara sentimentos por nada e desconfiava de todos.
Era mais que um alcoolatra mendigo, mas jamais conseguiria voltar a ser um homem de verdade. isso lhe havia sido roubado ha muito, ou morto por ele mesmo. ou pelo mundo todo a volta dele.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Enquanto caminhavam, quase correndo na verdade, um raio cortou os céus com violência assustadora, iluminando a metrópole de pecados e medos em seus cantos mais escuros. Samuel parou e olhou para cima. Sentia algo...

- Vêm, seu maluco! – disse Jet.

Há milhares de quilômetros dali algo cortava os céus, zunido em direção a terra, mas atravessava um ar quente e morno do verão xiita. Não era algo nem de longe tão belo quanto a energia da natureza cortando uma tempestade, mas era milhares de vezes mais mortal. E essa energia ao tocar o solo espalhou-se por quarteirões cevando prédios, carros, postes, carne e osso. A área atingida era de certa de oito quarteirões. O barulho ensurdecedor do ar sendo empurrado pelo calor vinha temperado com gritos de morte e desespero até o ouvido de Nue, que olhava aterrorizado pela janela.

Mas o que mais o assustou foi o silencio. Do impacto até a ulyima onda de choque, pocuco menos de um minuto havia se passado. O silencio estrangulante durava mais que o dobro disso antes de ser rompido pelo som de ambulâncias e carros de policia, que ainda soavam abafados para Nue. Seu prédio ficava praticamente na margem de segurança da explosão, escapando com poucas rachaduras e sobrevivendo ao impacto com não mais que pouco chacoalhar. Mas Nue não ouvia nada. Ouvia noticias de bombas e atentados terroristas o tempo todo, ainda mais onde morava, mas jamais chegara a presenciar algo assim. A bomba havia explodido no exato momento que olhava pela janela, naquela exata direção. Nem sentiu as ondas de choque. Recostou-se e sentiu-se solitário como um homem morto naqueles escombros. Becca!

O mundo real se jogou em cima dele com o peso do universo ao seu redor. Por um instante mal pode se mexer sentiu o coração gelado e apertado.

Becca era uma estudante de intercambio humanitária e pacifista. Estava na casa de Nue, pois seu pai era chefe de estado.

Apaixonaram-se na mesma semana em que ela chegou, e naquele dia ela iria para o centro da Cida, que já não existia mais. Já estava na porta quando viu seu celular tocando em cima da mesa, voltou, podia ser ela.

-Alô, Becca?

-Nue, graças a Deus, onde você está? – A ligação estava horrível, mas pode perceber que era seu pai.

- Estou bem pai, tenho que ir ajudar essas pessoas, tchau.

Desligou o celular e o colocou no bolso, saiu de seu apartamento e desceu as escadas correndo, estava do lado de fora do prédio quando se deu conta do que realmente estava acontecendo.

Havia uma multidão na rua, gritando e o exercito cercava a área. Carros oficiais e médicos aceleravam em todas as direções.

Tentou ligar para Becca. Ela não atendeu. Tentou novamente. Seu celular perdera o sinal. Abafado, ao longe o som já característico da morte. Outra explosão.

O povo desesperado corria em toda a direção. O exercito perdeu o controle da situação, era a brecha que Nue esperava. Desviando aqui e ali, correndo o mais que podia viu na frente o caminho aberto como que por mágica.

Mal sabendo como, logo estava escondida em escombros próximos a área de contenção do exercito. As forças armadas iraquianas jamais devem ser levadas na brincadeira, muito menos desafiada por um garoto, fosse filho de quem fosse. Se fosse pego ali, encrencaria a família toda.

Quando no exercito, aos 12 anos, a pedido do pai, Nue se destacou também, tanto nas artes marciais secretas praticadas nessa nobre instituição quanto no treinamento tático. Mas sua paixão eram os cálculos físicos, os segredos do universo, e aos 20 abandonou a promissora carreira militar pra estudar física na faculdade publica local.

Poderia dar conta de um soldado, se armar e garantir que passaria pelos demais com uma boa chance, mas um soldado iraquiano nunca esta sozinhos. Teria que sair dali furtivamente, e ir em direção ao centro da explosão, no caminho de Becca, as chances eram poucas, ele sabia. Mas não desistiria.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Capitulo 1


O coração batia forte e rápido, os passos apressados comiam metros com fúria e fome. O peito arfava com o esforço, subindo e descendo rápido. "Não, não agora". Se jogou no banco de uma praça que acabou entrando sem perceber. As nuvens cuspiam raios incandescentes e o parque estava vazio. Reclinou a cabeça e fechou os olhos ao sentir as primeiras gotas pesadas. Logo já distinguia o barulho da chuva em tons diferentes. Mais grave e curto na grama. Alongado e plástico sobre o paletó. Oco e macio sob a pele. Frio e reverberante na pedra do banco.

- Moço, seus cigarros!

Samuel levou provavelmente o maior susto da vida. Se ajeitando no banco viu o que não esperava.

Achou que ia ver aquela linda garota de ar gótico de antes. Mas era ela e algo mais. Ali parada havia mais que uma garota de olhar esmeralda. No momento que percebia isso, essas esmeraldas faiscaram.

- Han... Obrigado...

- O que aconteceu cara? Você achou que a gente ia roubar você?

Ela disse isso e assumiu uma postura um pouco mais defensiva. Só agora percebera que estava sozinha.

- Não, eu só... – encarava as pontas de suas botas – tive que...

“Que fofo, ele é tímido, não perigoso” pensou ela.

- Já que você ia me dar o maço, acho que posso fumar mais um com você, não é? – nem ela acreditava que disse isso, já podia ver Milla sussurrando no seu ouvido: “Jett, esse cara é horrível, meu”. No outro instante se viu empurrando a amiga pra longe.

- Claro, faço questão... Se a chuva deixar a gente sequer acender o isqueiro... Tem um café ali, vem, eu pago, imagina, eu insisto. - Não sentia que era mesmo dizendo aquilo.

Era uma caminhada de dois ou três minutos, e a chuva engrossava ainda mais. A garota vestia apenas meias compridas e listradas de vermelho e branco pelos braços e o vestido. Além de uma bota enorme. Samuel tirou o casaco e jogou nos ombros dela.

Ela recuou e percebeu que não devia ter se sentido assim. Mas achou estranho, não estava acostumada a gracejos. Normalmente a maioria dos homens que saia acabavam bêbados se mostrando pra suas amigas. Sentiu-se estranhamente reconfortada com aquilo. Sorriu e disse baixinho:

- Obrigada.

O coração de Samuel quase parou.

Capitulo 1


Quando empurrou as portas de vidro do consultório chique, Samuel deu de cara com um clima pesado. Nuvens negras pairavam sob sua cabeça e coração naquela tarde que prometia ser chuvosa. Ajeitou seu casaco por sobre os ombros e passou a andar devagar pela calçada. A certa altura puxou um cigarro de seus bolsos.
- Ai moço, me dá um cigarro?
Samuel perdeu a razão do caminhar. Encarando-lhe havia longos cabelos negros rajados de vermelho emoldurando um rosto pálido e desvirginado em luxuria e maquilagem. Lábios finos escondiam um aparelho dental de borrachas rosas. Olhos verdes faiscantes gritando esmeraldas encaravam-no dentro da alma. Por um momento, estivera fora de si.
- Claro. - A voz dela era rouca e lenta, “cremosa” aos ouvidos de Samuel, e quando ela sorriu...
Estendeu o maço ate ela, que esbarrou em seus dedos pra puxar um dos cigarros. Samuel sentiu a neve aos primeiros raios de sol do verão. Precisava sumir dali,
mas ali era seu ponto de ônibus!
Deixou o maço com a moça e saiu em disparada, a ouvindo chamá-lo pra lhe devolver. “Não posso” pensava ele.

Regenese


Capitulo 1
O gatilho

-Têm conseguido sonhar, Samuel?
O psicólogo levou um olhar fulminante que não esperava. Sorriu sem graça e se ajeitou na poltrona.
- Ainda não... E não vejo a importância disso.
- Sr. Samuel. O sonho é a maneira que o cérebro usa pra organizar o que aprendeu durante o dia e descansar. Não sonhar nunca é bom. Talvez seja por isso que o senhor tem se sentido assim...
- Eu não sonho desde sempre doutor, e só tenho me sentido assim há pouco tempo.
- Talvez o senhor tenha, na verdade, sonhado desde sempre, mas não se lembre. Você nunca teve a sensação de acordar sem saber onde está, ou lembrar-se de coisas que não parecem ser suas memórias...
“O tempo todo” pensou Samuel. Se aquele homem soubesse, sairia dali numa camisa de força, com toda certeza.
- Não é que não lembre, doutor, é não sonhar mesmo.
- Como o senhor pode ter tanta certeza?
Nesse momento o relógio fez seu clique característico, mostrando que os cinqüenta minutos de Samuel haviam terminado. O doutor o viu se levantar rápido. Ele não gostava das sessões, sabia disso, mas havia ali um problema que deveria ser solucionado, de alguma maneira, sabia que Samuel precisaria de ajuda. Só não sabia ainda que tipo de ajuda.
- Sabe, Samuel, posso lhe dar mais alguns minutos...
- Obrigado doutor, eu tenho mesmo que ir, mas tem sido bom conversar com você.
Sabia que era mentira, ele odiava as sessões. Não estava indo bem no trabalho e isso se tornou uma exigência do seu chefe.
Deram as mãos e ele partiu, deixando um sorriso amarelo e forçado para a secretaria.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

O começo do fim


Andando por ruas vazias e fedorentas, Jhooney sempre percebe seus pensamentos voltados á mesma direção, ao mesmo tempo que uma sombra de preocupação per passa por sua face, pois ela não deve se deixar devanear, simples segundos em sua própria mente podem lhe custar a vida. É sempre assim por aqui, num instante você está vivo, no outro já não mais. Sobrevivência está em falta no mercado.